Te convido à ler este artigo ouvindo “Bridge over troubled water” do eterno e inesquecível Elvis Presley. A letra dessa canção é uma oração e espero que ela encha o seu coração de fé, esperança e amor. 

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Eu imigrei para Montreal, no Canadá, em novembro de 2009 e, para minha surpresa, o ano mais difícil não foi o primeiro. O ano de 2010 foi repleto de desafios, alegrias e eu conto essa história nos artigos anteriores que estão no meu blog: a partida do Brasil, os primeiros meses, a primeira casa, as primeiras experiências profissionais e muito mais. Mas o ano mais difícil da minha vida foi, certamente, 2011 quando tive depressão.

Eu vim para o Canadá repleta de sonhos e quando vi que as coisas não estavam acontecendo como eu havia sonhado, meu coração começou a se frustrar. Te explico. Em fevereiro de 2011, resolvi deixar o meu primeiro emprego para tentar a admissão em um MBA na universidade HEC Montréal. Resolvi arriscar tudo pois, um dos motivos pelos quais eu tinha imigrado, era estudar e crescer profissionalmente. Para ser admitida no MBA eu tinha que apresentar, até maio de 2011, os exames TOEFL e GMAT. TOEFL é um teste de proficiência em inglês e o GMAT (General Management Assessment Test) é um teste difícil pra caramba de inglês e matemática. Inglês eu não tenho dificuldades, mas matemática… você que leu meu artigo anterior sabe o quão loira eu sou pra matemática! Passei final de fevereiro até maio de 2011 estudando para as provas. Neste período, eu já estava começando a apresentar sintomas de tristeza profunda. Apesar de me dedicar muito aos estudos, eu sabia das minhas limitações. Essas limitações me faziam tremer de medo só de pensar que eu poderia fracassar na prova e me encontrar sem mestrado, sem emprego e sem dinheiro. E foi o que aconteceu.

No TOEFL e na parte de inglês do GMAT eu fui bem, mas na matemática… Saí da prova do GMAT e imediatamente recebi o resultado: eu tinha afundado na prova. Saí aos prantos, sem forças, desanimada, frustrada…. Eu já estava exausta emocionalmente e agora teria que me lançar no mercado de trabalho. Só de pensar nisso me dava pânico.

AUTOESTIMA

O fracasso afetou minha autoestima profundamente. Sei que talvez, lendo esse texto, pareça um exagero ficar assim somente por uma prova que eu não passei, mas sei que quem já imigrou vai me entender. Eu estava tão frágil e tão sem confiança em mim, que só de pensar em abrir o computador para olhar emprego me dava pânico. Eu acordava chorando, abria o computador e não conseguia fazer nada. Isso me dava mais ansiedade, porque o tempo estava passando e eu estava completamente paralisada pela minha ansiedade. A ansiedade é um mal absurdo para a alma do ser humano e possui um poder paralisador desastroso.

ALMA EM SUSPENSÃO

Lina Donnard Canada 12

Photo by Marco Diniz

Eu sempre fui uma pessoa solar e sociável. Sempre fui puro sorriso, alegria e bom humor. Quando me dei conta, eu estava sorrindo pouco, não tinha vontade de ver quase ninguém e não encontrava prazer em quase nada. Sentia minha alma em suspensão, meio anestesiada para a vida. Sair de casa era uma luta. Eu que sempre adorei sair, ver gente e lugares diferentes! Por que eu? Eu sentia taquicardia ao caminhar na rua e sentia como se as pessoas estivessem me olhando. Minha mão suava. As buzinas dos carros me agrediam e qualquer coisa me dava vontade de chorar. E eu chorava…. Chorei a vida diante de Deus. E falando em Deus, meu blog é laico e eu respeito todas as crenças. Quem me conhece sabe. Mas não me levem à mal, é impossível contar a minha história sem mencionar Ele, o Criador de todas as coisas. Aquele que escreveu a minha história e me amou antes mesmo de eu ser gerada no ventre da minha mãe.

ACEITE SUA CONDIÇÃO E BUSQUE A CURA

Fazendo algumas pesquisas e conversando com um amigo muito próximo que tem problemas de depressão, percebi que esse era o meu caso. Confesso que, no início, foi difícil aceitar pois era como se eu tivesse fracassado. Me sentia incompetente por não aguentar encarar a vida como eu deveria. Senti raiva de mim várias vezes. Eu pensava comigo mesma “Eu vim para realizar sonhos no Canadá e agora me encontro em um pesadelo… Eu vim para ser forte e me vejo fraca…. Eu vim para ser feliz e agora estou profundamente triste… Eu vim para me realizar profissionalmente e sequer consigo abrir o computador para procurar um emprego…”. Eu cheguei no Canadá cheia de perspectivas e, em 2011, me vi completamente perdida.

Sair de casa era muito difícil, mas eu me forçava. Estava exausta de me sentir deprimida. Queria cura! Todos os dias eu fazia caminhadas no bairro Outremont, que é um dos mais lindos de Montreal. No alto desse bairro tem uma entrada para um parque e, nesse parque, há um caminho que sobe até o monte que fica atrás do Oratório Saint-Joseph. A natureza me curava: o cheiro das árvores, o barulho das folhas com o vento, a brisa fresca, o calor do sol e o canto dos pássaros. Quando eu chegava no topo do monte, a vista para Montreal era incrível. Esse caminho é bem escondido, por isso quase sempre eu estava sozinha, o que era perfeito para mim. Lá de cima do monte, eu falava com Deus. E como em tudo há um lado positivo, o fato de estar tão sensível me proporcionou experiências sensoriais que nunca mais vou esquecer.

Lina Donnard Canada 11

Photo by Marco Diniz

Olhando o horizonte e aquela paisagem incrível, eu tinha momentos de reflexão profundos sobre o que eu queria para a minha vida e, certamente, ficar na depressão não era! E a cada dia que eu fazia essa caminhada, eu observava que meu emocional ia se equilibrando. Trabalho voluntário, alguns amigos queridos e meu namorado mais que especial na época também foram muito importantes para o meu processo de cura, mas fato é: quando estamos deprimidos nos sentimos só e somente Deus sabe o que se passa em nossas almas. Por isso, se você imigrou e está com depressão, saiba o seguinte: busque todas as ajudas que puder, mas saiba que somente você tem o poder de tirar a sua alma das sombras. Todos os dias você terá que escolher ficar curado.

EU NÃO ERA A ÚNICA

Junho de 2011 fui para o Brasil. Em casa, com a família, me senti muito melhor. O amor fortalece! Ninguém sabia o que eu estava passando emocionalmente e sei que, para muitos, esse artigo será uma surpresa. Desde que imigrei guardei muitas coisas para mim. Preferi resolver eu mesma ao invés de preocupar os que me amam. E não é orgulho! Apenas sabia que eu iria superar e que tudo ia ficar bem. Voltando do Brasil no inicio de agosto, eu passaria pela pior fase. Antes de ir para o Brasil, eu tinha a desculpa que iria viajar e não adiantaria buscar um emprego sendo que eu só poderia começar em agosto. O mês de agosto tinha chegado e, agora, era pra valer! Me inscrevi em uma organização do governo que oferece apoio para buscar emprego. Aprendi muito e vi que eu não era a única a estar com o emocional frágil. Conversando com outros imigrantes vi que eu não estava só naquele deserto: vi dor e esperança, desânimo e coragem, frustrações e sonhos em cada imigrante.

As trocas de experiências com outras pessoas foram me fortalecendo e sou infinitamente grata por isso. Esses imigrantes que eram desconhecidos e, ao mesmo tempo, meus irmãos na caminhada me ajudaram sem saber. Agosto, setembro e outubro de 2011 foram os piores meses. Eu trocava o dia pela noite pois não conseguia dormir e, acordando tarde, sentia que estava desperdiçando a vida o que, consequentemente, causava em mim crises de ansiedade e pânico. Muitas vezes eu saia para caminhar aos prantos e me perguntava quando aquela dor na alma ia passar.

ENCARE A DOR

Diante de tanta dor na alma, a gente até se pergunta para que existir se é tão insuportável, não é? Dá vontade de fugir de si. Dar um “bye bye planeta Terra”. E não é drama. Todos nós, seres humanos, passaremos por algum momento assim na nossa existência. Existir é, sem dúvida, maravilhoso e eu pretendo morrer velhinha em uma cama bem quentinha enquanto eu durmo. No entanto, existir também é dor. Veja bem, eu não estou sendo negativista quando digo isso. Ao contrário, busco sempre ser positiva e, por isso, aprendi que quando a dor chega, temos que encará-la.

Se você quer imigrar, prepare-se para encarar dor na alma. E se você imigrou, sei que está me entendendo. Muitos imigrantes têm depressão por diferentes motivos: sonhos frustrados, falecimento de uma pessoa querida em seu país de origem, falta de realização pessoal e profissional, o frio intenso do Canadá, solidão e saudade da família.

No meu trabalho como coaching acadêmico e profissional, frequentemente eu atendo pessoas em estados emocionais muito frágeis. Depressão, síndrome do pânico, desesperança e autoestima baixa. Alguns dias atrás atendi duas pessoas e antes que elas terminassem de falar eu fui relatando o que elas estavam passando. Detalhe por detalhe. Elas se assustaram e me perguntaram “Lina, como você sabe disso tudo? É exatamente isso!”. E eu respondi “Porque passei pela mesma situação”.

AMOR E GRATIDÃO

Sou extremamente grata pelos meses de depressão que tive. Sabe por que? Porque hoje posso ajudar outros imigrantes. Hoje entendo o processo mental da depressão e tenho o privilégio de ajudar outras pessoas a sair desse deserto através de orientações muito práticas.

E quero te dar algumas dicas agora mesmo:

  • Independente da sua situação, tenha o coração grato. A pior fase da minha vida foi quando o meu coração ficou ingrato e eu não conseguia enxergar tudo de maravilhoso que eu tinha ao meu redor;
  • Não hesite em buscar ajuda profissional. A depressão, depois de um tempo, muda até a química do corpo e não há mal nenhum ser medicado por um tempo desde que com orientação médica;
  • Coma alimentos antidepressivos, cuide da sua saúde e da sua beleza;
  • Faça trabalho voluntário: cuidar dos outros vai curar a sua alma. Eu faço desde os 15 anos e tem sido maravilhoso. E quer saber? Quanto mais dura a realidade melhor será: favelas e hospitais são incríveis. Vai por mim!;
  • Atividade física na natureza: estamos muito desconectados da natureza, ou seja, de nós mesmos. Se possível, nade no mar, cachoeiras, lagos, tome sol, corra em campos, montanhas, tenha contato com animais e depois me conte o resultado 😉 ;
  • Se abra com pessoas íntimas: na depressão, temos a tendência a nos isolarmos. Esse é um erro. Também não precisa se expor para todos, mas abra seu coração com pessoas íntimas;
  • Desenvolva a sua fé: eu não estou falando de nenhuma religião específica. Cada um tem a sua fé. A minha você já sabe qual é. Entrar no meu quarto, orar em secreto e sentir que, no meu interior, Deus cuida de mim é maravilhoso!;
  • Se ame: ninguém pode fazer isso por você. Fuja da auto-piedade! Não cometa atos de auto-boicote, fazendo mal para você mesmo. Atitudes desse tipo são muito comuns na depressão. Não… não faça isso com você mesmo meu querido leitor. Você é totalmente especial e único nessa existência. Não existe e não existirá mais ninguém como você na história da humanidade. Você tem noção do que é isso? Isso é muito poder em suas mãos!;
  • Chore, chore e chore. Acho muito significativo que a lágrima seja de água e que saia dos olhos. Quando sentimos dor na alma, expressamos através do choro: água que lava a alma e limpa os olhos. Coloque pra fora a sua dor e permita ser lavado e ter a sua visão renovada;
  • Independente da fonte da sua depressão, só existe um caminho: o amor. Ame a você mesmo e ame o próximo e, inevitavelmente, a sua cura chegará até você. Eu não sei quase nada sobre a vida, mas o pouco que vivi me fez entender que somente o amor é invencível. O amor tudo suporta. O amor sempre vence. No amor sempre há esperança.

MENSAGEM PARA OS MEUS PAIS

Pai, mãe, sei que deve ser muito duro para vocês, como pais que me amam tanto, ler este artigo. Posso imaginar a dor de vocês ao imaginar a minha dor. Mas fiquem na paz, estou bem e forte em Deus. Cada vez que nos falamos por telefone e que nos encontramos, eu me renovo no amor de vocês. Vocês são inspiração e força para minha alma.

E para você, caro leitor imigrante ou futuro imigrante, não temas! Tudo na vida passa. Só o amor não passará jamais!

#vemserfelizemmontreal #vemserfeliznocanadá

Obs: quem quiser ler mais à respeito, recomendo este site que tem me feito muito bem desde 2011, logo quando comecei o processo de depressão.

Lina Donnard é brasileira, de Belo Horizonte, imigrante e mora em Montreal desde 2009. É consultora em educação no Canadá e coach profissional para integração ao mercado de trabalho.